O sábado é o santuário de Deus no tempo, no qual todos podem entrar
por Alberto R. Timm
A Bíblia fala de um santuário tão antigo quanto a própria humanidade. Esse santuário, embora faça parte do tempo, não se desgasta pelo tempo, e é suficientemente abarcante para acolher todos os filhos de Deus espalhados ao redor do mundo. Esse santuário de Deus no tempo é o sábado, qualificado por Abraham J. Heschel como “um palácio no tempo”.1 Mesmo não sendo visto com os olhos físicos, esse santuário está em toda parte, podendo ser adentrado a cada sétimo dia da semana.
A instituição do sábado
Em Gênesis 2 aparece o relato de como foi instituído esse santuário no tempo: “Assim, pois, foram acabados os céus e a terra e todo o seu exército. E, havendo Deus terminado no dia sétimo a Sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a Sua obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda a obra que, como Criador, fizera.” Gênesis 2:1-3.
Deus instituiu o sábado através do tríplice ato de descansar, abençoar e santificar. Houvesse Deus apenas descansado, e dúvidas ainda poderia haver quanto à validade desse descanso para as criaturas. Mas o fato de Ele também haver abençoado (transformando em um canal de bênçãos) e santificado (separando para uso sagrado) esse dia confirma a instituição edênica do sábado para a raça humana.
Sakae Kubo declara, em seu livro God Meets Man, que Deus “escolheu um segmento de tempo” para comungar com Suas criaturas por três motivos: (1) porque o tempo é universal, e está em toda parte; (2) porque o tempo é imaterial, apontando além do espaço e da matéria para as coisas espirituais; e (3) porque o tempo é todo-abarcante, jamais oscilando em intensidade.2 São essas características do tempo que permitem que o sábado, como um segmento de tempo, chegue igualmente a todos nós (ricos e pobres, cultos e incultos), unindo-nos em uma só família. Não é isso algo maravilhoso?
Significado do sábado
Mas o que significa esse santuário de Deus no tempo para nós hoje, que vivemos no início do século XXI? Eu creio que ele nos revela pelo menos seis coisas fundamentais para a nossa existência.
1. O sábado revela o poder criador de Deus. A origem do sábado está diretamente ligada à poderosa atividade criadora de Deus. O texto bíblico nos diz que no sétimo dia da semana da criação Deus instituiu o sábado, descansando, abençoando e santificando esse dia. O quarto mandamento do Decálogo ordena que o sábado deve ser observado “porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou.” Êxodo 20:11.
A observância do sábado nos convida, negativamente, a deixar de lado nossos “próprios interesses” (Isaías 58:13) e, positivamente, a voltarmos nossa atenção a Deus e à Sua obra. Essa experiência restaura o verdadeiro relacionamento criatura-Criador.
2. O sábado revela a soberania de Deus. O sábado é uma instituição que reflete claramente a vontade soberana de Deus, pois o Criador não buscou o conselho de Suas criaturas para estabelecer o sábado3, e cada sábado inicia, prossegue e termina com base em um ciclo astronômico estabelecido por Deus, independente da vontade humana. Em contraste, a substituição da observância do sábado pela veneração do domingo, por autoridade eclesiástica humana, foi (e continua sendo) um atentado direto à soberania divina.
Observando o sábado, estamos reconhecendo a soberania de Deus em nossa vida e testificando ao mundo que os caminhos de Deus, apesar de nem sempre serem os mais fáceis, sempre são os melhores. A genuína observância do sábado rompe com o fluxo egocêntrico da vida, levando-nos de volta a uma vida centralizada em Deus.
3. O sábado revela a imparcialidade de Deus. Vivemos hoje em uma sociedade tecnológica, caracterizada pela competitividade e pela discriminação. Na frenética corrida da vida, os mais lentos, os mais pobres e os mais ignorantes são simplesmente deixados para trás. Financeiramente, poucos têm muito e muitos têm pouco ou mesmo nada. No mundo das modernas comunicações, a televisão e a Internet têm exercido o duplo efeito de aproximar os distantes e distanciar os próximos. E a busca incessante de astros humanos tem gerado a constante indagação a respeito de quem é “o maior” e de quem é “o melhor”.
Mas esta não é a maneira como Deus age. Quando Ele escolheu um meio para comungar com o homem, não escolheu algo palpável no espaço, que beneficiasse a alguns, em detrimento de outros. Em Sua imparcialidade, Ele escolheu um segmento de tempo, que estivesse universalmente presente em todas as partes.4 O mesmo Deus que “faz nascer o Seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos” (Mat. 5:45) também concede o Seu sábado a todos igualmente. Assim, a cada semana irrompe o sábado, como um divino equalizador da humanidade, integrando ricos e pobres, cultos e incultos, em uma só família.
4. O sábado revela o respeito divino ao livre-arbítrio humano. É importante notarmos que, a despeito de o sábado ser universalmente disponível, ele não é imposto a ninguém. A realidade é que podemos existir no sábado, sem que o sábado exista para nós. O próprio mandamento “lembra-te do dia do sábado, para o santificar” (Êxodo 20:8) implica (1) que Deus não impõe a observância do sábado às Suas criaturas; (2) que podemos viver durante o sábado sem santificá-lo; e (3) que a santificação do sábado só ocorre quando existe uma resposta humana voluntária e positiva ao gracioso convite divino.
A verdadeira observância do sábado significa um encontro voluntário entre Deus e o homem, mutuamente comprometidos pelo concerto eterno da graça divina. É somente quando há uma resposta humana de fé à iniciativa divina de comungar com o homem, que o sábado atinge seu verdadeiro propósito.
5. O sábado nos ajuda a restaurar o verdadeiro sentido da vida. Vivemos num mundo povoado por pessoas especialistas e desequilibradas. Na gangorra da existência, alguns enfatizam o aspecto intelectual, em detrimento dos demais. Outros investem todas as suas energias no desenvolvimento físico. Já outros vivem apenas pelo social. E existe ainda os que se excluem do mundo para viver somente em função de uma religião mística.
Mas a observância do sábado afeta integralmente o ser humano em todos os aspectos de sua existência (ver Êxodo 20:8-11; Isaías 58:12-14; Mateus 12:12), ajudando-o a colocar suas prioridades onde elas realmente devem estar: em Deus e nos outros (cf. Mateus 22:36-40).
6. O sábado é um conduto das bênçãos divinas. Há aqueles que alegam que a observância do sábado não passa de uma demonstração de legalismo. Isso pode ocorrer, se alguém pretende alcançar méritos para a salvação através da observância do sábado. Mas a verdadeira observância do sábado é, em realidade, o maior antídoto ao legalismo, pois significa deixar de lado nossos “próprios interesses” (Isaías 58:13) para descansar nos méritos da graça divina e nos alegrar nas obras do nosso Maravilhoso Criador-Redentor.
É interessante notarmos quão profundamente ligado à experiência da salvação está o sábado em Hebreus 4. Nesse capítulo o sábado é visto como “o sinal exterior de uma experiência interior”5 de “estar descansando em Deus (cf. Hebreus 4:10), que vem como resultado de estar sendo salvo pela graça ( 4:16), mediante a fé (4:3).”6 A escritora Ellen White declara que, “a fim de santificar o sábado, os homens precisam ser eles próprios santos. Devem, pela fé, tornar-se participantes da justiça de Cristo. Quando foi dado a Israel o mandamento: ‘Lembra-te do dia do sábado, para o santificar’, o Senhor lhes disse também: ‘E ser-Me-eis homens santos.’”7
Portanto, a verdadeira observância do sábado significa desobstruir a vida dos interesses seculares, possibilitando que as bênçãos divinas fluam copiosamente para nós.
As bênçãos do sábado
Existem pelo menos cinco grandes bênçãos que derivam da verdadeira observância do sábado.
1. Obtemos uma visão mais clara do caráter de Deus. Criado por Deus, o sábado revela o próprio caráter de Deus.
2. Desenvolvemos maior sensibilidade à revelação de Deus na natureza. Instituído na Semana da Criação, o sábado nos lembra a multiforme criação de Deus (animais, aves, peixes, plantas, flores, etc.). Se a natureza foi criada por Deus, como podemos amá-Lo verdadeiramente sem apreciar as obras de Suas mãos?
3. Desenvolvemos a estabilidade existencial que deriva do relacionamento criatura-Criador. A gangorra da vida tende a desestabilizar nossas emoções. Quando somos bem-sucedidos, assumimos muitas vezes uma atitude auto-suficiente. Quando nos saímos mal, frustramo-nos com facilidade. O sábado nos lembra que nossa segurança não está em nossas realizações humanas, mas na dependência do nosso Criador.
4. Aprimoramos o nosso relacionamento social. Rompendo com o nosso egocentrismo natural, o sábado nos convida a viver uma vida alterocêntrica em relação com os demais seres humanos, incluindo familiares, amigos, necessitados, etc. (ver Mateus 12:12).
5. Melhoramos nossa saúde física e mental. Você já pensou alguma vez o que seria da nossa vida sem o sábado? Mesmo não desfrutando das bênçãos espirituais do sábado, o benefício para a saúde física e mental já compensa a sua observância.
Conclusão
O sábado é, em realidade, o santuário de Deus no tempo; e, como filhos de Deus, somos convidados a adentrar semanalmente esse santuário, “para contemplar a beleza do Senhor e meditar no Seu templo” (Salmo 27:4). Somos instados pelo profeta Isaías a nos tornarmos reparadores “de brechas” e restauradores “de veredas”, testemunhando aos outros das bênçãos que advêm de deixarmos de lado os nossos “próprios interesses” para nos deleitar “no Senhor” (Isaías 58:12-14).
Por que não elevamos aos Céus o nosso pensamento, cada sábado, em louvor ao nosso Grande Criador-Redentor? “Ó Senhor, Senhor nosso, quão magnífico em toda a Terra é o Teu nome!” (Salmo 8:1 e 9). “Levantai ao alto os olhos e vede. Quem criou estas coisas? Aquele que faz sair o Seu exército de estrelas, todas bem contadas…” (Isaías 40:26). Porque “os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras de Suas mãos” (Salmo 19:1). Permitamos que cada sábado seja uma bênção em nossa experiência, restaurando em nós o genuíno espírito de louvor e gratidão a Deus.
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Referências
1. Abraham J. Heschel, The Sabbath: Its Meaning for Modern Man (New York: Noonday Press, 1951), pág. 12.
2. Sakae Kubo, God Meets Man: A Theology of the Sabbath and Second Advent (Nashville, TN: Southern Publishing Association, 1978), pág. 24.
3. Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, 14a ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1995), págs. 47 e 48.
4. Kubo, págs. 23 e 24.
5. M. L. Andreasen, The Book of Hebrews (Washington, D.C.: Review and Herald, 1948), pág. 173.
6. Alberto R. Timm, “El significado del concepto de descanso en Hebreos 3 y 4”, Theologika (Peru) 10, n0 2 (1995), pág. 222. Ver também: Alberto R. Timm, “O Sábado na Experiência da Salvação”, Revista Adventista, abril de 1985, págs. 11-13.
7. Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, 17a ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), pág. 283.
(Sétimo Dia)
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